domingo, 27 de dezembro de 2009

Sobre Ergonomia Cognitiva

Como nos ensina Abrahão, Silvino e Sarmet (2005), a Ergonomia Cognitiva é um campo de aplicação da Ergonomia que tem como objetivo explicitar como se articulam os processos cognitivos face às situações de resoluções de problemas nos diferentes níveis de complexidade. Desta forma, a ela visa analisar os processos cognitivos implicados na interação: a memória (operativa e longo prazo), os processos decisórios, a atenção (carga mental e consciência), enfim as estruturas e os processos para perceber, armazenar e recuperar informações.

Para Weill-Fassina (1990), os processos cognitivos são compreendidos como sendo constituídos de modos operatórios, de seqüências de ação, de gestos, de sucessões de busca e de tratamento de informações, de comunicações verbais ou gráficas de identificações de incidentes ou de perturbações que caracterizam a tarefa efetiva realizada pela pessoa. Dessa forma, é preciso realizar registros que possam descrever as etapas, o desenvolvimento temporal das atividades, as estratégias utilizadas, verbalizações e as relações entre essas variáveis, bem como identificar variáveis que possam modificar a situação corrente.

Assim sendo, o ergonomista busca as informações emitidas pelas pessoas, seja em forma de comportamento, seja em forma de verbalização, buscando formar um ‘quadro cognitivo’ claro sobre a pessoa. Este quadro irá subsidiar decisões de como ajustar e/ou conceber a interface à pessoa. A conexão entre a atividade e as representações disponíveis e utilizadas origina um delineamento da estratégia operatória desenvolvida pela pessoa para resolver um problema posto ou tomar uma decisão.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

O Trabalho Imaterial e a Empresa Pós Industrial

Apontei no post de setembro a importância do consumidor e da estratégia da empresa pós industrial no tratamento da informação com este consumidor. Neste post, pretendo elaborar um pouco mais sobre a empresa pós industrial e o conceito de trabalho imaterial.

Assim pergunto: o que caracterizaria empresa pós-industrial? Respondo: o consumidor intervir de maneira ativa na constituição do produto ou serviço, tornando-os uma construção e um processo social de concepção e de inovação. Inaugura-se, aqui, uma norma de produção dos serviços dificultando o antigo estabelecimento de uma medida “objetiva” da produtividade. Essa integração do consumo na produção é denominada pelos brilhantes filósofos italianos: Lazzarato e Negri, de trabalho imaterial. Ou seja, aquele que ativa e organiza a relação produção/consumo. Essa ativação é materializada dentro e por meio do processo comunicativo. É o trabalho que inova continuamente as formas e condições da comunicação. Dá molde e materializa as necessidades, o imaginário e os gostos do consumidor.

Uma particularidade da mercadoria produzida por esse trabalho está no fato de que ela não se destrói no ato de consumo, mas alarga, transforma, cria o ambiente ideológico e cultural do consumidor. Assim, produz acima de tudo uma relação social (uma relação social de inovação, de produção, de consumo). Nesse contorno de produção de relação social, a “matéria-prima” do trabalho imaterial é a subjetividade e o “ambiente ideológico” na qual a subjetividade vive e se reproduz. Um exemplo é o site de relacionamento Orkut, como observado por Amstel (site usabilidoido): “existe algo nele que faz as pessoas entrarem num estado mental de completa imersão na atividade”. Pode-se afirmar que não é apenas o que existe no orkut, mas o que “existe” na pessoa que faz com que ela entre nesse estado mental? Seria a possibilidade de fluir e (re)elaborar a subjetividade num ambiente on line compartilhado?

Enfim, a Internet é de fato um típico modelo desse ambiente ideológico de produção imaterial. Desde o seu surgimento e desenvolvimento a Internet gestou novas estratificações da realidade, novos modelos de ver, de sentir, de relacionar. O e-commerce, essa forma de transação comercial global, em que vende e compra-se qualquer mercadoria ou serviço de qualquer parte do mundo, com despesa operacional reduzida, maior facilidade, rapidez e eficiência é um exemplo específico de uma nova estratificação da realidade, com novos modos de perceber e se relacionar. O comércio por meio eletrônico fomenta a maneira pela qual a sociedade e as organizações percebem a atividade comercial: o consumidor é o foco, ele é quem dita as regras do consumo. Portanto é imperativo a qualquer estratrégia on line que se busque com esta ponta final - o consumidor, como ele navega, quais modos operatórios, tomadas de decisão e de resolução de problemas, bem como quais seus gostos, desejos, seu imaginário. Enfim, além da usabilidade é mister direcionar a estratégia para a uma produção de relação social com o consumidor e se possível, deste com outros consumidores ou mesmo com outros atores deste ambiente ideológico.

sábado, 24 de outubro de 2009

Sobre a Ergonomia e a Tecnologia

A Ergonomia é uma área do conhecimento que visa transformar os artefatos tecnológicos, adaptando-os às características das pessoas, bem como às características de sua atividade, almejando assim, uma otimização do conforto, da segurança e da eficácia. Seu objetivo é humanizar a tecnologia defendendo a premissa de que esta deve ser adaptada às características das pessoas em articulação com as exigências sócio-técnicas das tarefas realizadas, aos objetivos a serem cumpridos e as condições tecnológicas efetivas que lhes são dadas. Trata-se, portanto de uma abordagem mediadora entre a pessoa e a tecnologia como forma de assegurar que a lógica que guia a ação da pessoa seja contemplada tanto no processo de concepção quanto de reformulação das interfaces em geral.

A Ergonomia possui como pressuposto epistemológico: o antropocentrismo, e como principal pressuposto metodológico: a Análise da Atividade. Esta Análise considera a conduta humana em situação real, as estratégias operatórias que a pessoa efetivamente utiliza para executar a atividade. Utilizo o termo conduta em detrimento de comportamento porque o conceito de conduta introduz uma noção de “motivos” ou de “intenção”. Dessa forma, trabalhando em uma perspectiva antropocêntrica, a Ergonomia, além de aumentar a produtividade e qualidade, contribui para uma redução da carga de trabalho tanto em seu componente psíquico, que determina as vivências de prazer da pessoa, quanto em seu componente físico, minimizando os esforços biomecânicos e fisiológicos, como também em seu componente cognitivo, diminuindo suas exigências, como a memória, resolução de problemas, processos decisórios, dentre outros.

A Análise da Atividade é o fio condutor da intervenção ergonômica. Esta abordagem é centrada sobre o estudo da atividade real de execução da tarefa. Portanto, a Ergonomia não é uma área do conhecimento do objeto, e sim de sua interação. Não existe um estudo ergonômico da cadeira e sim um estudo ergonômico na cadeira. Assim sendo, a presença do ergonomista em situação real de uso de um artefato é um fator determinante. Essa presença constitui a diferença fundamental entre a Ergonomia e outras abordagens. Em poucas palavras, a Ergonomia é uma ciência da interação e da transformação (da tecnologia à pessoa).

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Expandindo o conceito de web 2.0: o trabalho imaterial e o poder do usuário final


Fala-se sobre o conceito de web 2.0 como uma forma de sensibilização de um novo paradigma de interação onde o usuário é co-participante em uma tecnologia que permite a interatividade. Entretanto esta tendência apenas espelha a mesma tendência em outras áreas de produção.

Essa afirmação é melhor compreendida ao contextualizar historicamente a evolução da produção econômica. Segundo Blackwell, Miniard e Engel (2005), nos primórdios das colônias norte americanas até a guerra civil, os traders (uma espécie de atacadista) serviam de ligação entre produtos europeus e o mercado norte americano. Eram esses distribuidores que determinavam o que seria oferecido aos consumidores, se eram vestidos vermelhos ou camisetas verdes ou mesmo barris de açúcar. O consumidor tinha pouca ou nenhuma influência nesse processo.
A manufatura surgiu no século XIX dando início ao poder dos produtores. Esses tinham a incumbência de decidir quais produtos deveriam ser feitos, quais as cores e as embalagens que deveriam ser oferecidas, como deveria ser a propaganda e em quais pontos de varejo. Henry Ford costumava dizer que “o consumidor podia escolher entre um modelo T5 preto e um outro T5 preto”. O cenário apresentado começou a modificar após a Segunda Guerra Mundial, quando o varejo passou a tomar o poder da cadeia de suprimentos. Megavarejistas, como por exemplo o Wal*Mart, não só eram maiores que muitos fabricantes de produtos mas, o mais importante, eles estavam mais próximos dos consumidores. Os varejistas começaram a impor seus pontos de vista sobre o que fabricar, como os produtos deveriam ser embalados, onde deveriam ser estocados, qual seu preço e como deveriam ser vendidos. Os varejistas dominavam a cadeia porque eram a ponte entre a produção e o consumo.

Vivenciamos uma transformação cada vez mais intensa das condições de produção e comercialização de artefatos e o consumidor é participante ativo nesse processo. A empresa pós-industrial, como define Lazzarato & Negri (2001) é fundada sobre o tratamento da informação e, desta forma, estrutura sua estratégia de produção do que encontra no final dessa cadeia de valor: a venda e a relação com o consumidor. Isso implica afirmar que o foco da empresa baseia-se sobre a produção e o consumo de informação e que o consumidor tem grande influência no processo produtivo. Mobilizam-se, então, importantes estratégias de comunicação e de marketing para reaprender a informação (conhecer a tendência de mercado) e fazê-la circular (construir o mercado). Logo, a mercadoria pós-industrial é o resultado de um processo de criação que envolve tanto o produtor quanto o consumidor. Portanto, o processo de gestão da cognição compartilhada torna-se o diferencial competitivo para qualquer tipo de organização.